Mesmo com o anunciado, e ainda não cumprido pelo governo federal, desbloqueio dos 5,8 milhões, a universidade não tem condições de pagar suas contas básicas
Texto: Caroline Pires e Versanna Carvalho
As instituições públicas de ensino superior brasileiras têm se deparado nos últimos anos com sucessivos cortes, decretos e medidas que cerceiam a sua autonomia e promovem um desmonte da educação no Brasil. O mais recente golpe foi a publicação do Decreto 11.216, que altera o Decreto nº 10.961, de 11/02/2022, que se refere à execução do orçamento deste ano, que, na prática, afetou 20% da verba para despesas de custeio da UFG, bloqueando 5,8 milhões e zerando o caixa da UFG para este tipo de despesa. Essa ação unilateral e sem aviso prévio por parte do governo federal impede a universidade de licitar, empenhar e contratar. Na prática, a UFG a partir de agora não tem como pagar os fornecedores de água, luz, limpeza, segurança, manutenção predial, de material para laboratório (seja de pesquisa ou de ensino) material de manutenção e almoxarifado nos meses de outubro, novembro e dezembro.
Diante deste cenário, a Reitoria da UFG convocou na manhã de hoje, 10/10, uma reunião com os gestores das diversas unidades acadêmicas e órgãos administrativos da Universidade, com o objetivo de fazer um relato sobre o bloqueio, que ainda não foi restituído, e impede além do custeio e o andamento das licitações. A reitora da UFG destaca que esse é o momento de mobilização para que a Universidade possa enfrentar essa situação. “Os R$ 7,8 milhões cortados em junho mais os R$ 5,8 milhões bloqueados somam 20% de todo o custeio da Universidade. A situação é gravíssima e a Andifes propôs uma série de ações de mobilização neste mês de outubro”, afirmou. Ela frisou que o desbloqueio, anunciado pelo governo federal, e que ainda não voltou ao caixa da UFG, não significará nenhuma melhora no quadro das contas das instituições de ensino públicas. “Estávamos no trabalho de retomar essa verba cortada em junho e fomos surpreendidos por esta nova situação de corte. Precisamos não só da liberação desse valor retirado do nosso orçamento em junho, mas também da reposição desse último bloqueio. Reforço que apesar do anúncio não recebermos o retorno desses 5,8 [milhões de reais] para nossos caixas”, frisou.
Angelita Pereira de Lima, afirmou que está sendo articulado um dia de mobilização conjunta das IPES e entidades estudantis, em 18/10, para defender a reparação desses recursos para as instituições
O vice-reitor da UFG, Jesiel Carvalho, disse que esse momento é para afinar os discursos sobre essa situação e levar para a sociedade o impacto desse tipo de medida. “Precisaríamos de um orçamento de 130 milhões de reais para custeio. Recebemos 69 milhões no início do ano e desse valor, já insuficiente, mais ainda nos foi retirado”, esclareceu.
Detalhando a situação orçamentária difícil que a Universidade tem enfrentando e contando do esforço da gestão para evitar um colapso, o pró-reitor de Administração e Finanças da UFG, Robson Maia, entende que nesse momento mesmo o desbloqueio não resolve a situação financeira da instituição. “O sinal está vermelho. Não há retorno do recurso. E a nossa preocupação principal é a reversão do corte de 7,8 milhões [de reais] de junho. Lamento dizer que dificilmente isso será revertido”, apresentou. Segundo ele, a partir de agora não é possível mais executar nenhum empenho ou pagamento a empresas que prestam serviços a UFG nos próximos meses. Além disso, é preciso que a sociedade esteja atenta ao fato que a previsão de orçamento para 2023 é 12% menor do que o recebido no ano atual. O que se agrava ao fato do projeto de lei orçamentária não ser aprovada esse ano. Caso isso se confirme, nos três primeiros meses de 2023 a Universidade receberá 1/18 do seu orçamento, até a aprovação da lei orçamentária. “Esse bloqueio é só um sinal que até o final do ano, e possivelmente no primeiro trimestre do próximo anos, a universidade irá viver um cenário seríssimo sem a reversão do que nos foi tirado”, apresentou.
Vice-reitor, Jesiel Carvalho, afirmou que o valor recebido para despesas de custeio da UFG no início de 2022 foi pouco mais da metade necessária, e deste montante, parte foi bloqueada
Para simplificar a compreensão de todos, Robson Maia, informou que apenas o gasto de água, energia e limpeza demanda mensalmente da UFG o valor de R$ 5,3 milhões. “Mesmo que recebamos o desbloqueio ele não resolve em nada a nossa situação atual”, concluiu.
Vale lembrar que até o momento, o orçamento contingenciado na quinta-feira (6/10), no valor de R$ 5,8 milhões, não retornou ao sistema financeiro da Universidades Federal de Goiás (UFG). Cabe ressaltar que no primeiro semestre de 2022, os recursos da UFG já haviam sido cortados pelo governo federal, em um montante que alcançou a marca de R$ 7,8 milhões. Quando o valor bloqueado nesta semana retornar para a Universidade, a instituição volta para uma situação anterior que já era calamitosa e grave.
Contramão
A reitora observa que este tipo de atitude vai na contramão da prática orçamentária do País. “O que acontece nos meses de setembro, outubro e novembro, principalmente em outubro e novembro, é o desbloqueio de recursos e de verbas de orçamento para que as instituições, autarquias e órgãos tenham condições de executar o orçamento. Ou seja, para licitar, empenhar e contratar. O mês de outubro não é mês de bloquear, é mês de desbloquear o orçamento. Se não, chega 31 de dezembro com recursos bloqueados, os recursos retornam e perde-se o recurso. Isso vai na contramão da prática orçamentária”, relata.
Pró-reitor de Administração e Finanças, Robson Maia, detalhou o preocupante cenário financeiro da UFG
Apesar do cenário negativo, o pró-reitor de Administração e Finanças destaca o fato de “a UFG sempre ter como prioridade o empenho da assistência estudantil e das bolsas acadêmicas. Assim, conseguiremos evitar o impacto imediato e direto aos estudantes no próximo mês, nos dando tempo para reverter a situação junto ao MEC”, antecipa. Robson comenta que recursos do Programa de Apoio à Pós-Graduação (Proap) não foram afetados pelo bloqueio.
Contingenciamento às vésperas das eleições
No último dia 30 de setembro, véspera do primeiro turno das eleições, a educação superior pública brasileira sofreu mais um golpe, com um novo contingenciamento no orçamento do Ministério da Educação, no percentual de 5,8%, que impede que sejam empenhadas as despesas das universidades. Um rombo no valor de R$ 328,5 milhões de reais que retirou a possibilidade do pagamento de despesas básicas para o bom funcionamento das instituições, que estavam tentando se estruturar após um corte orçamentário de 7,8 milhões que foi imposto pelo governo federal em junho deste ano. Com o contingenciamento R$ 2.399 bilhões (R$ 1.340 bilhão anunciado entre julho e agosto e R$ 1.059 bilhão agora) foram bloqueados, impactando inclusive os recursos que são frutos de emendas parlamentares – RP9.
O pró-reitor de Administração e Finanças, Robson Maia, explica que o corte ocorrido em junho já deixou a UFG com enormes dificuldades orçamentárias. “Desde então passamos a direcionar esforços na reversão da crítica situação junto ao MEC. Contudo, ao contrário do que se esperava, fomos novamente surpreendidos, no dia 3 de outubro, com o bloqueio de todo orçamento que nos restou, já insuficiente para cobrir as despesas até o final do ano, dado o corte anterior”, afirmou.